terça-feira, 1 de setembro de 2009

Os processos (pouco) democráticos e o Tratado de Lisboa (ou Constituição Europeia)

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O referendo irlandês: 1º tentativa

“Não”, foi o que disseram a 12 de Junho de 2008 53.4% dos votantes irlandeses contra os 46.6% que votaram “sim”. Como é exigida a ratificação unânime de todos os Estados-membros, o resultado do referendo irlandês impediu a entrada em vigor do Tratado de Lisboa.
Foi uma chatice para os dirigentes europeus, mas a democracia é assim…

De facto, a Irlanda foi o único Estado-membro que levou este tema a referendo nacional, por obrigação da sua própria Constituição. Os restantes 26 países europeus optaram (leia-se os seus dirigentes políticos), por ratificar o Tratado de Lisboa por voto parlamentar (no caso português por aprovação na Assembleia da República) a fim de evitar “problemas” como os que podem surgir em referendos nacionais. Imagine-se só o estranho caso onde cidadãos através de referendo decidem democraticamente contrariamente ao desejo dos seus governantes.
Isto de dar voz ao povo pode ser mesmo uma chatice...

O referendo irlandês: 2º tentativa

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Numa atitude de acordo com os mais elevados valores democráticos, foi decidido que os irlandeses não estavam a pensar muito bem quando foram a referendo, aquela vitória do “não” foi vista como talvez como uma joke irlandesa, para não ser levada a sério. Foi dito aos irlandeses que seriam contemplados com uma nova oportunidade de voto, um novo referendo. E desta vez seria explicado com muito detalhe e energia que a cruz era para assinalar no “yes”.

Sendo assim, no próximo dia 2 de Outubro os irlandeses serão chamados de novo às urnas para se pronunciarem se são favoráveis ou desfavoráveis à adopção do Tratado de Lisboa. E desta vez todos os esforços estão a ser feitos para fazer mudar a opinião de quem votou desfavoravelmente no último referendo, senão veja-se: a empresa Ryanair vai gastar 500 mil euros numa campanha a favor do “sim”. Recentemente a gigante Intel tinha já anunciado um investimento de centenas de milhar de euros numa campanha semelhante.

Desta vez não pode mesmo falhar, mas se falhar se calhar até se faz outro referendo. Ou então alteram-se as regras do jogo para que não seja necessária a unanimidade dos Estados-membros.

Mas voltando um pouco atrás no tempo… convém relembrar para quem sabe e está esquecido e informar quem não sabe e passará agora a saber, que o actual Tratado de Lisboa é basicamente o mesmo documento que a Constituição Europeia. Foi quase como mudar a capa de um livro, retirar a temível palavra “Constituição” e alterar ligeiramente o seu conteúdo. A estratégia adoptada não é nova, tal como no caso do referendo dos irlandeses, se não é à primeira, tem de ser à segunda!

1ª tentativa: A Constituição Europeia

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A chamada de alerta dos políticos de que seria de evitar a consulta popular, proveio do “fracasso” dos referendos nacionais que se realizaram em 2005 na França e Holanda sobre a Constituição Europeia, com a vitória do “não”. Ficou deste modo completamente inviabilizada a ratificação da Constituição Europeia.

2ª tentativa: O Tratado de Lisboa

O Tratado de Lisboa é um documento que teve a sua génese no fracasso da Constituição Europeia. É de facto nas suas linhas gerais o mesmo documento. Confesso que não li nenhum dos dois documentos na íntegra, portanto não afirmo a sua semelhança em primeira pessoa. As semelhanças que afirmo partilharem os dois documentos é fruto de algumas leituras que se encontram facilmente na internet sobre este tema, de quem efectivamente analisou o conteúdo dos dois documentos e seus objectivos.

A não leitura destes dois documentos constitui por si só um sintoma preocupante mas muito comum no contexto da sociedade europeia. Para pôr em termos simples: são grandes e complicados. Acrescente-se a falta de campanhas de informação e de descodificação por parte dos governos. Simplesmente ninguém lê estes documentos, ninguém os explica, mas toda a gente diz que é bom e que é para aprovar!

Mas então que significa conduzir estes processos tão importantes desta maneira? Significa que ninguém sabe de nada! Desconhece-se os seus objectivos, metodologias e implicações. Bastaria um simples inquérito de rua sobre o conhecimento que a população em geral detém sobre este assunto e muito facilmente se verificaria que a maioria sabe tanto do Tratado de Lisboa ou da “antiga” Constituição Europeia como eu sei sobre os hábitos reprodutivos da mosca da fruta.

Convém ressaltar que fruto dos referendos, os nossos vizinhos irlandeses além do privilégio de se poderem pronunciar, serão provavelmente os mais informados informados acerca deste tema.

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